127ª. A castidade conjugal – 14/11/1984

1. À luz da Encíclica Humanae vitae, o elemento fundamental da espiritualidade conjugal é o amor infundido no coração dos esposos como dom do Espírito Santoi. No sacramento, os esposos recebem este dom juntamente com uma particular “consagração”. O amor está unido à castidade conjugal, que, manifestando-se como continência, realiza a ordem interior da convivência conjugal.

A castidade significa a vida segundo o ordenamento do coração. Esta ordem permite o desenvolvimento das “manifestações afetivas” na proporção e no significado que lhes são próprios. Desse modo, a castidade conjugal também é confirmada como “vida no Espírito”ii, segundo a expressão de São Paulo. O que o Apóstolo tinha em mente não era somente as energias imanentes do espírito humano, mas, sobretudo, o influxo santificante do Espírito Santo e de seus dons particulares.

2. No centro da espiritualidade conjugal, portanto, está a castidade, não só como virtude moral (formada pelo amor), mas igualmente como virtude ligada aos dons do Espírito Santo — acima de tudo com o dom da reverência por aquilo que vem de Deus— (“donum pietatis”). Este dom é o que o Autor da Epístola aos Efésios tem em mente quando exorta os cônjuges a “sujeitarem-se uns aos outros no temor de Cristo”iii. Assim, por conseguinte, a ordem interior da convivência conjugal, que permite às “manifestações afetivas” desenvolverem-se segundo a sua justa proporção e significado, é fruto não só da virtude na qual os cônjuges se exercitam, mas também dos dons do Espírito Santo com os quais colaboram.

Em algumas passagens (particularmente HV 21 e 26), quando trata especificamente da ascese conjugal, ou do empenho em adquirir as virtudes do amor, da castidade e da continência, a Encíclica Humanae vitae fala indiretamente dos dons do Espírito Santo, aos quais os cônjuges se tornam sensíveis ao amadurecerem na virtude.

3. Isso corresponde à vocação da pessoa humana ao matrimônio. Aqueles “dois”, que — segundo a expressão mais antiga da Bíblia — “serão uma só carne”iv, não podem realizar tal união ao nível de pessoas (communio personarum), a não ser através das forças provenientes do espírito e, precisamente, do Espírito Santo que purifica, vivifica, fortalece e aperfeiçoa as forças do espírito humano. “O Espírito é que dá a vida, a carne não serve para nada”v.

Daqui resulta que as linhas essenciais da espiritualidade conjugal estão “desde o princípio” inscritas na verdade bíblica sobre o matrimônio. Tal espiritualidade está também “desde o princípio” aberta aos dons do Espírito Santo. Se a Encíclica Humanae vitae exorta os cônjuges a uma “oração perseverante” e à vida sacramental (dizendo: “abeirem-se, sobretudo pela Santíssima Eucaristia, da fonte da graça e da caridade”; “recorram com perseverança humilde à misericórdia divina, que é outorgada no sacramento da Penitência”vi), fá-lo enquanto é grata ao Espírito que “vivifica”vii.

4. Os dons do Espírito Santo, e em particular o dom da reverência por aquilo que é sagrado, parecem ter aqui um significado fundamental. Este dom, de fato, sustenta e desenvolve nos cônjuges uma singular sensibilidade a tudo aquilo que na sua vocação e vida em comun traz o sinal do mistério da criação e da redenção: a tudo aquilo que é um reflexo criado da sabedoria e do amor de Deus. Portanto, aquele dom parece iniciar o homem e a mulher, de modo particularmente profundo, na reverência pelos dois significados inseparáveis do ato conjugal, de que fala a Encíclicaviii em relação ao sacramento do matrimônio. A reverência pelos dois significados do ato conjugal só pode desenvolver-se plenamente com base numa profunda orientação à dignidade pessoal daquilo que na pessoa humana é intrínseco à masculinidade e à feminilidade, e inseparavelmente em referência à dignidade pessoal da nova vida, que pode nascer da união conjugal do homem e da mulher. O dom da reverência por tudo que é criado por Deus exprime-se, precisamente, em tal orientação.

5. A reverência ao dúplice significado do ato conjugal no matrimônio, que nasce do dom da reverência pela criação de Deus, manifesta-se também como temor salvífico: temor de violar ou de degradar o que traz em si o sinal do mistério divino da criação e da redenção. É desse temor, precisamente, que fala o Autor da Epístola aos Efésios: “Sujeitai-vos uns aos outros no temor de Cristo”ix.

Se tal temor salvífico é imediatamente associado à função “negativa” da continência (ou seja, à resistência contra a concupiscência da carne), ele também se manifesta — e em medida crescente, na proporção em que tal virtude amadurece — como sensibilidade plena de veneração pelos valores essenciais da união conjugal: pelos “dois significados do ato conjugal” (ou melhor, falando com a linguagem das análises precedentes, pela verdade interior da mútua “linguagem do corpo”).

Com base numa profunda orientação a estes dois valores essenciais, o significado da união dos cônjuges é harmonizado na pessoa com o significado da paternidade e maternidade responsáveis. O dom da reverência pelo que Deus criou faz com que a aparente “contradição” nesta esfera desapareça e a dificuldade derivante da concupiscência seja gradualmente superada, graças à maturidade da virtude e ao poder do dom do Espírito Santo.

6. Se se trata da problemática da chamada continência periódica (ou seja, do recurso aos “métodos naturais”), o dom da reverência pela obra de Deus ajuda, por via de regra, a conciliar a dignidade humana com os “ritmos naturais da fecundidade“, isto é, com a dimensão biológica da feminilidade e da masculinidade dos cônjuges; dimensão que também tem um significado próprio para a verdade da mútua “linguagem do corpo” na convivência conjugal.

Deste modo, também aquilo que —não tanto no sentido bíblico, quanto até mesmo no “biológico”— se refere à “união conjugal no corpo”, encontra a sua forma humanamente madura graças à vida “segundo o Espírito”.

Toda a prática da honesta regulação da fertilidade, tão estreitamente unida à paternidade e à maternidade responsáveis, faz parte da espiritualidade conjugal e familiar cristã; e só vivendo “segundo o Espíritose torna interiormente verdadeira e autêntica.

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i Cf. Rm 5, 5.

ii Cf. Gl 5, 25.

iiiEf 5, 21.

ivGn 2, 24.

vJo 6, 63.

viHumanae vitae, 25.

vii2Cor 3, 6.

viiiHumanae vitae, 12.

ixEf 5, 21.