A agonia e o êxtase do ser uma só carne

Por Christopher West

Tradução: Julie Maria e Fabrício Ribeiro

O título de um artigo recente no “National Catholic Register” me chamou atenção. “Divórcio: imagem e semelhança com o Inferno” (30.9.07). As primeiras frases confirmaram o que eu intuí do título – esta escritora, Melinda Selmys, iria falar abertamente. Parece que ela já estava cansada do doce, devoto jargão com o qual muitos escritores católicos geralmente falam sobre o matrimônio. Caramba, pelo que eu sei, ela talvez tenha pensado em mim.

Ela observa, “os teólogos nos lembram que nossa vida matrimonial é uma imagem da união entre… Cristo [e sua Igreja]. Nós escutamos da… felicidade dos dois se tornarem um.” Quando as coisas ficam difíceis, somos ensinados “a melhorar nossa comunicação, nos apaixonar de novo, cuidar dos momentos de carinho, etc., etc.”

Então ela permite que estes avisos sejam jogados fora com as reais experiências de muitos matrimônios atuais. “Como se apaixonar de novo”, ela perguntam, “por uma besta insensível que quebrou seu coração e dormiu com outra mulher”? Como você pode ver sua vida sexual como uma imagem da vida íntima da santíssima Trindade quando sua mulher tem relação somente na lua cheia quando Marte está na constelação de Virgem, e faz amor com o entusiasmo de um sapo morto?” Quando eu li pela primeira vez esta última linha, eu não sabia se eu chorava ou eu ria. Mas eu respirei aliviado, sim. Cara, é aliviador escutar pessoas dizendo como é mesmo.  Seja qual for a razão, esse tipo de escrito brutalmente honesto é raro na maior parte da imprensa católica. É como se as pessoas que promovem o ensino católico tivessem medo de não ter sucesso se falarem sobre os verdadeiros sofrimentos que enfrentamos ao seguir Jesus. Então nós convenientemente promovemos as glórias da visão Cristã sem as considerações realistas dos sofrimentos. Eu mesmo penso ter sido culpado disso às vezes.

O matrimônio cristão é um caos, é uma empresa dolorosa. Como poderia ser de outro modo? “Maridos amai vossas esposas como Cristo amou a Igreja” (Ef 5, 25). Se a união matrimonial é uma imagem da união de Cristo com a Igreja, isso significa, como Selma afirma, que o matrimônio irá implicar “a mesma agonia, combinação de lágrimas e sangue, os mesmos espinhos cravando nos nossos crânios, os mesmos pregos furando as nossas mãos.”

À vista de quantos católicos acreditam que a Igreja é “contra o sexo”, as glórias e os êxtases aos quais o autêntico ensinamento Católico chama os esposos em sua união, devem ser enfatizados. Mas estas glórias e estes êxtases são fruto de abraçar muito sofrimento purificador. Se a alegria não está adiante de nós, nós não teremos motivação para suportar o sofrimento. “Pela alegria colocada à sua frente Cristo suportou a cruz (Heb 12, 2). Mas se o caminho para tais alegrias não são avaliados de forma realista, nós iremos ingenuamente nos perguntar porquê o matrimônio é tão agonizante.

Como Selma escreve, em todo matrimônio existem momentos que parece impossível. Eu tenho certeza que quando Cristo caiu no caminho do Calvário, o pensamento de levantar a cruz de novo… parecia uma loucura. Talvez seja diferente pelos olhos divinos, mas para o homem, existem sempre momentos onde nos voltamos para o céu e perguntamos, ‘você enlouqueceu?’ Quando nós dificilmente somos capazes de ver o topo do Gólgota através das nossas lágrimas sujas, nós não recebemos nenhum conforto com a certeza de que a crucifixão não é tão ruim assim, e isso, visto em perspectiva, é de fato uma linda expressão de amor e de doação”.

Com certeza é uma linda expressão de amor. Mas é linda precisamente porque Jesus generosamente abraçou “prensa de lagar”[1] do sofrimento. É quando estamos face a face com esta “prensa de lagar” que nós somos mais tentados pelo pecado sexual – ter um caso, pornografia na internet, masturbação, contracepção. Porque? Porque o pecado sexual promete prazer sem dor, promete o vinho sem ter que passar pela prensa.

O amor verdadeiro sempre está ligado ao sofrimento. Como Pe. Paulo Quay disse no seu livro O Significado Cristão da Sexualidade Humana, “é precisamente esta ligação entre amor e sofrimento que é rejeitada pelo pecado”. Cristo sofreu imensamente amando sua esposa. Nós devemos segui-Lo.

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[1] Prensa que esmaga as uvas no processo de fabricação do vinho.